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O Poeta Erótico

08.08.23

Estou deitado no poema que escrevi
desfibrilou-se o verso para que continuasse vivo
prolongo-me neste sossego nocturno bebendo sôfrego
o silêncio das sílabas coladas nos lábios secos, olhando
o teu corpo que flutua nos lençóis de luar e suor

nas noites quentes de vígilia, pensar é
a ventoinha ligada que agita o ar imóvel
traz-me a frescura do teu sorriso adormecido
no berço do passado.

Sonhei que teu corpo flutuava
ilha solitária no berço azul, sem rumo
como uma Hespéride, perdida na asa do Zéfiro
não falemos do que a Lua fez ao teu corpo
de luz luciferiana de mármore polido
falemos dos meus pensamentos absurdos que
desfilaram como um exército desfilando
por debaixo de um Arco de Triunfo sem triunfo

ó fome que me acabo cedo e tarde me inicio
desvinculado aos ponteiros do relógio cujo
tempo é o meu rufar cardíaco e ansioso de um dia
voltar a sentir o teu seio pousado no meu peito
e ouvir o teu piar de ave alegre de manhã,
como se chamasse a própria vida a viver dentro dela.

fico como o morcego que passa perto do candeeiro
para lá, para cá, no silêncio emudecido, à procura
do soneto escrito com os dedos na tua pele láctea
que, ao tocá-la, parece que foi tocada pela Via

dei abrigo na cabeça a todos os fantasmas
de sementes passadas e frutos futuros
desenhei gárgulas terríveis que afugentassem
a morte quando as nossas bocas se encontravam
tímidas pós discussão, sôfregas quando a
saudade é um quarto almofadado insalubre

nas noites dolorosas, colo-me ao chão
escuto o batimento cardíaco da terra e da vida
à espera que irrompa e rebente do meu coração
uma bunganvília luxuriante em verso purpúreo

que Dafne em fuga és tu, faço círculos concêntricos
à tua volta para amar-te e a tua resposta
são ramos secos e folhas quebradiças

sem o viço verde das folhas de louro, dos teus braços brancos
é quando a treva mais se adensa e a luz não penetra
tesouro sem mapa, lugar sem x
onde o meu suor escorre e a minha dor termina

 

13.12.22

Nessa altura a tua vagina entreaberta
olhava-me catatónica, absorta e líquida
como se permanecesse encerrada
numa prisão de veludo, cuja chave
de entrada, ficava no bolso guardada
do intruso, diligente, vigilante
atento ao primeiro raio
do abrir de coxas

nessa altura de estátua estendida
na cama definida num espaço
geometricamente oposto ao amante
o ar nas tuas pequenas narinas
faziam de Éolo um músico
suave melodia delicada
anunciando o sono. Nessa altura
a cortesia da pressa dava lugar
ao vício prematuro, duro de
ficarmos suspensos viajando
num balão de ar quente
na imaginação

lembro-me que ficaste à porta
do extâse para que me visses a
mim, contorcer-me na epilepsia
do sexo, tão ridículos somos
quando felizes e anónimos, fluxo
e refluxo na leitura de livro
aberto que é sentir este
martírio quente de viver durável
e que inexoravelmente virá o fim
colocar um ponto final. Por isso
procuro a fonte, o sopro, a canção
da chuva copiosa, adversa ao espírito
silente de querer sofrer num
último aperto, morrer afogado
num lago estreito, cálido, descomposto
em baba de alguém que sofre
de catatonia crónica.

Come-me o fígado com teu bico
ó ave divina, regenera-o esponjoso
amaldiçoado na eternidade
roubei-te o fogo
do teu corpo onde agora,
agora mesmo
me aqueço no prazer
herético dos deuses

 

17.11.22

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Sonhei que eras a cidade branca

Erótica, eu um peregrino que te visitava, que
me embrenhava em todas as ruas e mistérios
recônditos fixando os nomes de cada rua
estreita, que havia sonhos dentro de ti
cafés, lojas e bazares iluminados de luzes trémulas
sonhei que os teus seios eram museus, visitei-os
molhei-os de saudade e ternura, porque havia tempo
para atravessar pontes, donde corria um rio direito
de água transparente, sonhei atravessá-lo, vê-lo por
onde seguia, misterioso, odorífero - num ângulo agudo,
convergi para onde o rio crescia, desaguando-me nas mãos
trémulas, folhas outonais, e este beco escuro, de lume aceso
aqueceu-me o coração gelado pelos rigores da vida
aceso entrei, determinado decidido a
permanecer, ergui-me, por um momento pensei
que flutuava num balão de ar quente, deslizando
pelo paraíso que era aquele lar ferido
que mal chega para um, minúsculo, porém, 
fervilhando de vida, de vida a enrolar-se e
embrenhar-se no tempo, sem fio, a perder-me de vista
e lambia esse momento com língua de gato
com língua de chuva, ao fundo a lua erguia-se
de boca aberta, masturbava-se, se enfiando num céu
preto de tinta da china, entre lençóis de nuvens. 
que cidade eras! que capital do desejo, que sumo
saiu de ti e de mim, que festas e bailes havia 
nos teus seios cheios, pintalgados de estrelas
de aurora boreal experimentei no teu sexo
molhado, nos teus ombros firmes, hipoptético
sentimento de tigre quando a presa caça. Hei-de 
visitar-te mais vezes, flor de charme, que és tu
cidade branca no cimo do monte que é o tempo

18.10.22

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Mulher madura és mais
em tudo, tudo em ti
é entrudo, entra tudo

quando abres o peito
abres-me o peito e
não vives, comes a vida

nada se perde, tudo
se transforma no mundo
que há dentro de ti

que poesia no corpo
encurvado, descobre-se
a curva do seio, que poesia!

como se voasse a coruja
planasse rente ao espírito
verde do meu coração

o seio palpita, a réstia
de mármore jovem
persiste, ainda excita

procuro-te, vejo-te
em palavras lúbricas
e desejos eólicos

gravitei, pousei em ti
sacodi o cansaço de cima
fervi em pouca água porque dura

cúbica criatura de costas
viradas, a anca sorri-me
corro perigo enquanto morro

não seres minha ilha
banhar-me na espuma das águas
nesse triângulo marítimo







(imagem retirada da internet)

 

27.09.22

 

uvas.jpg



Tens versos que anseio colhê-los com as mãos

e os meus dedos a escorrerem seiva tépida
excessivamente encharcados de ti, cheirando
a iodo acre e mel turvo

os versos devem ser os braços de Anfitrite
quando vem nos seus cavalos brancos
de braços estendidos de espuma

versos de ventosas de polvo ávido que agarram, sugam, sufocam
como peixe a debater-se fora de água. o estremecer da terra
não me sacia, quero o vulcão explosivo em erupção
expelindo lava ardente, tornando fértil o solo de húmidos lençóis.
Como escavar a terra com as duas mãos
faz-se um buraco, mete-se a mão no fundo e remexe-se
com as pontas dos dedos, assim quero encontrar-te água
esse verso perfeito de músculos retesados que explode
quando se sente o fundo no fundo do profundo,
a carne é duradoura, o verso imperecível
por isso recebe-me, uma, outra, e outra vez ainda
por isso puxa-me, ó campo magnético, faz-me desaparecer
no triâgulo oculto das Bermudas, no teu canal de Suez
onde apertado deslizo inteiro dentro de ti.
se fechar os olhos sinto a pele arrepiada
o motim da carne, a alegria túrgida dos teus seios
a contração das coxas, a lentidão da noite
caindo em ti, sol vertiginoso de inverno de ouro
colho-te o fruto, que o fruto na boca amarga a morte
o odor dos búzios confunde a tristeza, entedia o tédio
vire-se uma cruz ao contrário quando te crucifico
num pau duro que enrijecera da tua imaginação.
Tu, ilha flutuante secreta num imaginário azul
tu, arquitecta do marmóreo desejo endoidecido 
tu, musa impalpável, apalpo-te em verso
suturo a ferida das rosas com o espinho agudo do corpo
cubro o vazio no vácuo de vinil, sinto o
batimento do teu coração quando estremeces
gemes como apertado fole um som emite
tornamo-nos imunes ao tempo, vindimámos
as uvas de luxúria, encravámos as horas
sai-me em verso a serpente branca como se
apertasses a uva e salpicasse a tua boca de sumo

06.09.22

preview.mp4.jpg




Não é saudável vestires-te

de pele e infinito
não é amovível o peito
bastardo a espreitar pela blusa
peixe a debater-se com fama
de implacável assassino.

A garrafa de whisky cintilava
uma chama demoníaca dançando
ao som de sol e fel.
Se pudesse daria de beber
aos astros cheios de frio
num céu soberbo
de assombrosa medicina

Não falarei mais da lua.
Falo de ti. Falo para ti
Falo e cresço, esfíngico
no deserto onde te procuro
E não te encontro
apenas dentro do vazio
cálido, num quarto
de sombra zombeteira

Basta que um beijo me escape
bata asas voando ao lugar
Onde a minha boca alada
Fez ninho no
passado em escombros
ó frágil luminosidade
rosada e peregrina

06.07.22

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preso por um fio solto

quando te vi translúcida
a vir com a luz matutina
de mexer no logarítmo
que é a minha vida
baça sempre lúcida

trazias nos olhos o mar
na pele branca areia fina
o orgulho dos cabelos
(des)penteados pelo vento
marítimo e desigual

é como se viesses socorrer-me
do naufragio que era pensar
em ti e, no fundo, parasses
a desigualdade entre o
o bem de ser possível
e o mal do impossível

tens a palavra passe para
entrares no meu coração
peço-te um dia
de luz divina e vibrante
persistente a derreter
a densa treva que é
a minha solidão

 

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