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O Poeta Erótico

31.05.23

Lua.jpg



Tão bela és tu, ó Lua

que luz criminosa emanas
seduzindo poetas
reclamando para ti no céu
exclusivo foco fútil de
estrela de Hollywood

de vestido branco transparente
tu, filha de uma de muitas amantes
do divino deus dos deuses
mãe do crime e escuridão
criadora das sombras
que seduziu o vaidoso
sol para que viesse
vê-la num dia
que a noite durasse
eterna e maligna

contemplo-te, uivo-te
um soneto de sangue azul
que sangrei para ti
dá-me estímulo e luar
às pobres rimas baças
tu que andas de volta
das tuas armadilhas
pergunto, que animais caças
agora no século XXI

só os poetas não te possuem
ó dona infiel do luar
depois que te vejo vejo-me
ao espelho e parece que vi
um fantasma, que feitiço
o teu de me anarrares os olhos
com rede impalpável
e atenção intraduzível

olho o teu decote e o
mármore milenar é uma
armadilha, impossível
de soltar-me mesmo que
me debatesse ó musa
que nos admiras melancólica
de boca aberta por onde escorre
um fio de baba azul de prata

quantos anos tens, bela criatura?
és demasiado nova para mim
és demasiado cheia para mim
um dia morrerei e ficarás
entalada nos portões do céu
pintado de preto infinito
com vestido de plumas de plasma
que sorte tem o teu alfaiate
para saber-te as medidas
toca-te, apalpa-te, sente-te
mede-te, admira-te, contempla-te
e o vestido preto é uma
ode, esta ode que te escrevo
que não chega para atrair-te
uma noite que estivesses
húmida e tirasses o vestido
e brincasses comigo
lúcida à cabra cega

30.05.23

Vem amor, espero-te no altar menor
Eu, príncipe das Trevas, do sangue e ar
vigiado pelos olhos sinistros das gárgulas
à luz trémula de círios incrédulos

vem, amor, esperam-nos no submundo
no reino da hipnose e histeria imateriais
novos deuses conceberam  
um novo Olimpo de etéreos glaciares

vem, os deuses de hoje aguardam-nos
são homens líricos e lobos ferozes
colecionadores antigos de almas
alquimistas da velha verdade nova

vem que descobri esperança na Morte
deusa verdadeira do invísivel
impalpável mundo de vidro e cinza
imprevísvel espaço de sopro e vácuo

põe lençóis brancos na música que ouves
oculta por favor os versos que escreveste
são jóias colocadas em veludo preto
há crime original do reino da Arte

pois que o talento pede pão à porta
mendiga onde a porta nunca se abrirá
em cada rosto um pássaro aprisionado
vem amor, o submundo é perfeito

a verdade vestido de andrajos enlouquece
mendiga nas ruas da imundície e grita
não podes vencer o império da imagem
onde a moral se prega e nada se pratica

o culto do inculto a sedução do abismo
o ar envenenado, a água contaminada
o indirecto patrocínio da ignorância
esta tristeza não reter a vida inteira

o optimista produz no vácuo o vazio
é realizador de filmes de coisa nenhuma
onde o guião escrito é um papel em branco
vem, amor, o submundo é justo

 

26.05.23

 

Se o amor marcar encontro então que venha
cansei-me seguir-lhe o rasto críptico
levanto-me de manhã e beijo as faces
da Saudade, quem me encontrou primeiro
numa viagem rumo ao infinito

faço-lhe sonetos ao pequeno almoço
chamo-lhe nomes meigos, e no conforto
da preguiça felina volto aos lençóis
fechando livros do passado, no aconchego
deste amplexo ausente de gravidade

apresso-me a sair de casa, à procura do jornal
editado pelos rostos dos outros que se cruzam
comigo e nunca falham, em falhar-me
no cumprimento cordial de sol empreendedor
sem anomalia cognitiva

não vou punir-me mais porque deixei
lembranças nos versos escritos em papel
de lábios, de boca fecunda, em tinta
onde entornei tanta ternura
esparsa, sem complexo compromisso


a chuva nevrálgica fustiga o telhado
o cume da metáfora idílica incomparável
o aglomerado arvoredo entre as casas brancas
o guincho metálico da grua esquálida
o princípio do poema sem meio e fim

ando de um lado para o outro e a musa
não acorda e o amor é esta brancura por
explorar, terra incógnita, de floresta densa
do desonhecido íntimo que, incediada
arderá em verso igual ao coração.

e quando o sol entorna oblíquos raios
enterneço e caio na cadeira onde me
sento e canto as linhas verdes desta serra
onde de súbito, saída do silêncio
vem sentar-se ao colo a gata Solidão

 

25.05.23

a rapariga loira de olhos azuis
tentou abrir a porta mas ficou
com o puxador na mão

a porta era do meu coração

o verdadeiro amor
tem o odor do mar
amar sabe a dor

sóbrio seguro
a mão inseguro

da solidão

os olhos azuis

são microscópios
do mar onde navios
vindos do oriente trazem

versos lúcidos
de rara beleza

a floresta cerrada
adensa-se perante mim
de noite é tinta preta

fim

 

 

 

 

 

 

19.05.23

tarde-no-chiado.jpg

A clara luz do dia
fazia a sombra da infância
irreversível

sentir não é ofício
iluminaram-se versos como
sorrisos de rostos tristes

saídos da penumbra do
elevador cheio de lírios
não é meu amor, não é meu amor

senti a tua mão branca
longe da minha
como este roseiral

me lembra a minha avó
o salgueiro perfila-se
como mordomo do palácio

à porta a receber-me
pode entrar, meu senhor,
pode entrar, não vou entrar

deixe estar, ficarei cá fora
da vida sempre, a ver o que
se dissolve em água e não se bebe

recorda-se, um rolo de fumo
ou amistoso melro colando
a sombra dele à minha sombra

para onde vais, diligente
negro mensageiro, não piarei
junto às raízes das árvores

a pobre gente atravessa
o rio negro que tanta gente engole
a anomalia das luzes

e das fíguras e polignos
de arestas alinhadas entre
outros prismas e esferas

as várias maneiras de fumo
a sair de bocas oblívias
expelidos em anéis de vício

e ao longe entornarei
o olhar ávido sobre a rapariga
de cabelo apanhado e calças injustas

(ou não) de pernas elásticas
de maleável juventude
ó cisne inquebrantável

amor maior ser menor pintor,
o pincel a mente, talento a
memória, o coração ávido a vida

 

05.05.23

191104_r35263.webp

uma gata deitada no sofá,
vestida de céu descoberto
que me viesse ela parar ao colo...

os lábios mexem-se sensuais
procuram silêncios mordidos
pela penumbra do quarto

um livro atirado ao chão:
esperou por mim, lá fora
o vento sopra delinquente

o látego sacode-lhe a cauda
mostrando o perigo da
curva e contra curva

alinham-se cartas e astros
entrechocam-se peitos
os olhos fecham-se, abrem-se os sonhos

num beijo fálico que desagua
no rio Tejo, por onde mais
não se desce, o mar

esse beijo-o, ostra à mostra
prostra-se em posta
na durabilidade da língua

devagar se fazem impérios
num ápice desmancham-se prazeres
a Morte que fique à escuta atrás da porta

escrevi sonetos

na pele de leite e rosas
com dedos humedecidos

procuro-me no perfeito
encaixe, redimo-me,
no ir e vir de chuva e fogo

no revirar dos olhos
sacudo-me inteiro
depois que exorcisei o remorso

onde está a gata sentada
que era outra quando entrei
no quarto escuro dela

05.05.23

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O passado é um país que fica muito longe
a saudade infame crava-nos o punhal frio
assim como o teu nome

lembra-se a infância, queima-nos como estar ao sol
o primeiro beijo refresca-nos a boca como água
o nosso beijo arde no pensamento

a águia não é feliz porque faz círculos no céu
é porque vê de longe a presa e só se fixa nela
eu nem sequer te vejo

dói-me o parque infantil esvaziado na pandemia
a besta colossal que sacode a terra por debaixo
como tu próxima do extase

o acompanhamento da voz límpida e sincopada
o corpo amado espantando a própria morte
esgana-me a saudade

o ar deslocava-se calmamente quando
adejavas dentro de casa, parecia que as sombras
brincavam contigo

quando nos queixamos do tempo, não volta mais
amaldiçoamos o amor,  vira-nos as costas
e os anjos choram sangue

teu corpo pomar de luxo onde colhia o fruto
teu peito poemário onde encontra os versos
e agora a folha em branco

as tuas frases ficaram escritas a tinta permanente
brilham incandescentes como escamas de peixe
refulgem nesta espécie de martírio

a áspide vigia as enigmáticas pirâmides no Egipto
o poderoso tigre o inverno rigoroso na Sibéria
o arrependimento a mim

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